Certa vez, em uma aula de conversação de inglês há alguns anos, um professor pediu que escolhêssemos dois artistas brasileiros que queríamos conhecer e explicássemos o porquê. Escolhi Villa-Lobos e Elke Maravilha. Para o primeiro nome, indiferença total; parecia que aquele punhado de adolescentes e engenheiros nem sequer o conhecia. Para o segundo, incompreensão e risos; era como se eu houvesse dito uma bizarrice sem tamanho. Expliquei malmente os meus porquês, sem me esforçar muito, pensando que seria melhor nunca dizer-lhes que me sinto aprendendo a ser perspicaz quando leio Machado de Assis, ou que sinto prazer e vontade de dançar tango quando ouço Gardel cantar.
Sempre admirei aquela refugiada de guerra russa que chegou pequena com os pais ao meu país e aqui cresceu e se fez grande: uma artista completa, para mim igualável a Marília Pera e Ney Matogrosso, que cantava, atuava, dirigia... Uma mulher que pensava e trabalhava por um mundo muito à frente de seu tempo, que não se deixava tocar por tantos preconceitos ignominiosos que assolam a gente dos nossos dias... Uma pessoa culta, que exemplificava as coisas mais cotidianas amparada pelos grandes pensadores da humanidade e falava fluentemente mais de meia-dúzia de idiomas... Uma comunicadora de riso fácil e modos extravagantes, sim, em se tratando da persona que Elke vestia quando estava na televisão, mas de uma humildade e compaixão raras nos dias de hoje, e que quando ficava séria para falar do que necessitava seriedade, punha a calma na voz e, por consequência, a depositava também no olhar, porque aquele que é capaz de pôr a calma na voz sempre a irradia pelos olhos. Engraçado: excetuando-se meus familiares passados, atuais e vindouros, alguns grandes amigos e certos lugares onde estive, uma pessoa como Elke me inspira vontade de ver com os olhos.
Desde o constrangimento da aula de inglês, nunca comentei com ninguém, mas mantive o desejo secreto de poder conhecer Elke pessoalmente um dia, contudo, esse dia não chegaria. Foi com tristeza que recebi ontem (16/08) a notícia de sua passagem, porque uma pessoa como Elke não morre jamais: apenas passa momentaneamente para o outro lado. Infelizmente não a conheci, nem nunca tive a ideia de dizer-lhe o quanto a admirava pelas redes sociais, e agora ficou tarde.
Uma vez vi uma entrevista sua, em que lhe pediam uma frase preferida; Elke recordou uma frase do dramaturgo grego Sófocles: "O amor é invencível nas batalhas". De fato, alguém que acredita atualmente neste como seu lema de vida merece o meu respeito. Sei que, quando perceberem que a personagem desta crônica é Elke, muitos não a lerão, mas isso não importa. Um respeitável santo católico um dia também já pregou para os peixes, por isso posso fazer o mesmo em minha existência terrena e profana.
Dentre as várias acepções desta palavra tão rigorosamente lusófona que é saudade, li um dia que também se pode ter saudade daquilo ou daquele que não se conheceu. Refletindo sobre tudo o que acabo de escrever, concluo que aquilo que neste momento sinto são saudades de Elke. Que descanse, caso esteja se sentindo cansada. Que receba no céu, caso tenha ido para lá, caso o céu exista, a paz que sempre emanou para mim na terra. Até um dia, criança!...
Riso largo , gargalhadas , o olhar que falava mais que a boca , expressão num corpo esguio e alto . Tinha uma feição indefinida , era russa mas poderia ser de outras tantas nacionalidades . A voz , esta sim era de vários tons , impressionante . Fique na paz Elke . Sdds
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