quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

La Garganta Del Diablo

As referências de alguém que não está pautado nem orientado pelo sentido da visão são e estão em seu próprio corpo; começam a partir do corpo e terminam também nele. Assim, como explicar e como entender algo de proporções tão grandes e literalmente intocáveis, no sentido tátil, quanto as Cataratas do Iguaçu quando não se vê? Essa foi uma lacuna que se me defrontou uma vez, mas, contrariamente ao esperado, foi também brilhante e singelamente resolvida.

Todos a minha volta admiravam as quedas d’água e exclamavam coisas como: “Nossa, olha só”! “Que lindo”! “Quanta água”! Eu, por minha parte, ouvia aquele rugido colossal que parecia projetar-se das profundezas da terra e tentava imaginar um cenário que correspondesse às tantas exclamações que escutava. Até que o grupo separou-se e veio a proposta da Elizete, que eu já conhecia de outros carnavais:

- Quer que eu te leve lá na passarela? Assim, mesmo você não vendo as cachoeiras, vai sentir a água, aí vai imaginando...

Claro, aceitei imediatamente e fomos indo, ouvindo aquele fungar inominável das águas que, lançadas para cima e trazidas pelo vento, esparziam o meu corpo e cabelos naquela neblina revigorante e fresca... Até que chegamos frente a frente com a Garganta do Diabo. Parei diante dela, encostada à grade, deixando que a água me molhasse, contemplando aquele vazio inquietante e ruidoso lá embaixo... Agora aquelas tantas exclamações das pessoas começavam a fazer algum sentido. Assim ganhei as cataratas de presente pela primeira vez. Mas não foi essa a única representação que tive delas.

Para minha surpresa, Marcelo, o nosso guia lá de Foz do Iguaçu, sentando-se ao meu lado em um parque, perguntou, assim, de chofre:

- Me diz uma coisa... E você? O que ta achando das cataratas?... Na sua imaginação, como é isso?

- Amedrontador – respondi em uma palavra procurada durante algum tempo.

- Sim, de fato, é amedrontador – continuou ele – Mas, além disso, o que mais? Como você imagina, aí nas suas ideias, que sejam as cataratas?

Respondi que não era capaz de imaginar algo assim de proporções tão grandes. Para mmeu contentamento, ganhei as cataratas de presente pela segunda vez em tão curto espaço de tempo. Conto em um minuto como foi isso. Só peço licença para destacar aqui algumas proporções, informações, que permitirão aos demais leitores cegos desta crônica entender o porquê da minha dificuldade em imaginar o que Marcelo me perguntava. Conto como ele me presenteou daqui a pouco.

As Cataratas do Iguaçu demarcam, no rio Iguaçu – do tupi-guarani água grande – a fronteira natural entre o Brasil, em Foz do Iguaçu, no estado brasileiro do Paraná, e Puerto Iguazú, na província argentina de Misiones. São cerca de 275 quedas de água, sendo a mais impressionante delas a chamada Garganta do Diabo, exatamente na fronteira mencionada entre Brasil e Argentina, uma cachoeira com mais de 80 metros de altura. Historicamente, o primeiro europeu a avistar as cataratas do Iguaçu foi o conquistador espanhol Álvar Nuñez Cabeza de Vaca, por volta dos anos 1540. Escolhi, para intitular esta crônica, o nome desta queda mais importante, mas em espanhol, que para mim deixa a garganta mais diabólica do que em português... hahaa

Bem, agora posso continuar contando como o Marcelo conseguiu tornar concreta para mim a tão distante e inatingível Garganta do Diabo. Sentado ao meu lado, ele pediu licença e,tomando o meu antebraço esquerdo, posicionou-o na mesa a nossa frente de maneira horizontal, pedindo-me que abrisse os dedos daquela mão espalmada. Tocando a extensão do meu antebraço, começou:

- Imaginariamente, este aqui é o Rio Iguaçu.

Fazendo com os dedos uma massa compacta como quando gostaríamos de mostrar um número 4, continuou, tocando a letra “u” que se formava entre meu polegar e indicador:

- nos seus dedos estão as quedas das cataratas. Aqui no seu polegar estamos do lado brasileiro das cachoeiras. No seu indicador, passamos ao lado argentino. Aqui – disse, tocando a curva do “u” – é a Garganta do Diabo, que a gente vê de frente quando está no lado brasileiro das cataratas e de cima quando está no lado argentino, onde vemos toda essa água despencando sem parar – completou, indo e voltando com os quatro dedos na curva do “u” com rapidez, como a concretizar o fluxo frenético da água jorrante. – E, só para você saber – continuou, posicionando o meu braço direito a uma curta distância, verticalmente – Este aqui é o Rio Paraná.

Ah! Então era isso! As cataratas, claro que em proporção muitíssimo maior, eram assim... Era esse o fenômeno que toda a gente olhava abismada... Foi como se tivesse sido jogado um feixe intenso de luz sobre aquela irriquieta cortina d’água... E foi assim que, como eu disse, em um passe de mágica, ganhei as cataratas do Iguaçu de presente... Duas vezes!

- Obrigada, Elizete! Valeu, Marcelo! Onde havia um gigantesco ponto de interrogação vocês colocaram textura, cor, tamanho... O tipo da coisa que não tem preço.

Um comentário:

  1. Olá amiga querida , ler esta crônica foi emocionante . Pra quem ñ entende que vc possa ver , está aí a explicação . Parabéns !!! bjs . carol

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