20 de setembro, no Brasil, é o Dia do Gaúcho, por ser, primeiramente, o aniversário da Revolução Farroupilha (1835-1845), o mais longo conflito civil de nossa história, permeada que foi por tantos conflitos civis.
Ultimamente, tenho escrito bastante sobre o Uruguai. Uma das crônicas que planejei escrever a respeito daquele país tem como tema um museu que fui conhecer em Montevidéu, que dá destaque aos presidentes uruguaios, o primeiro deles que teve, por certo período de tempo, uma ligação estreita com o líder da nossa Revolução Farroupilha – Bento Gonçalves da Silva (1788-1847). Já que passamos, então, recentemente pelo Dia do Gaúcho, e já que também os uruguaios são gaúchos, assim como os argentinos, vamos a esta crônica um pouquinho antes do previsto.
Sempre que viajo, procuro privilegiar neste tempo o aspecto cultural. Assim, houve um dia em que decidimos sair para procurar em Montevidéu um programa cultural para fazer. A viagem quase chegava ao fim e ainda não havíamos conhecido a chuvinha gelada e o vento forte, tão típicos da cidade e tão propalados. Pois bem, justamente no dia em que decidimos sair a pé e sem capa nem sombrinha eles chegaram. A chuvinha gelada e um pouco apertada, tomei com prazer, recordando os tempos de infância, de férias em Pirassununga, em que eu reencontrava meu irmão e podíamos brincar juntos, na chuva, na casa da vó... Putz, como era bom brincar na chuva!!!
E foi debaixo daquela chuva trigelada que descobrimos o museu. Procurávamos pelo Teatro Solis, que ficava na mesma quadra. Dentro de uma loja havia uma uruguaia de olhos atentos, que nos viu e veio ao nosso encontro, tomando chuva também. Ela indicou o Teatro Solis e mostrou o prédio do museu, ali, diante de nós, sugerindo que fôssemos visitá-lo; fomos. Olharíamos o teatro de perto depois.
O Museo La Casa Del Gobierno era dedicado a todos os presidentes uruguaios. Nos foi possível ver retratos dos presidentes, quadros, medalhas, armas, coches, mobília, relógios, imagens reais e/ou fictícias do cotidiano dos uruguaios ao longo do tempo... Alguns presidentes tinham suas salas próprias; outros, talvez sobre os quais o museu tivesse menos itens, compartilhavam salas. Há um circuito que se pode fazer, começando pela sala do primeiro presidente, Fructuoso Rivera, e terminando pelos dias atuais. Um breve giro pela história do Uruguai em aproximadamente duas horas, com folga, olhando tudo sem pressa.
Dois dos presidentes que têm mais destaque no museu, que possuem suas salas próprias, são José Fructuoso Rivera (1784-1854) e Manuel Oribe (1792-1857), respectivamente primeiro e segundo presidentes da República Oriental do Uruguai. (Imaginem só, toquei, parte por parte, o coche oficial do presidente Rivera... Ah, a visita prometia...) Esta crônica pretende apresentá-los melhor, levando em conta a importância histórica que têm, de certa forma até os nossos dias, para a política do país. Explico-me.
A região onde fica o Uruguai foi alvo de disputas constantes. Antes da independência do país, portugueses e espanhóis a disputaram inúmeras vezes. Acontece que chegou um tempo em que a maior parte das próprias colônias portuguesas e espanholas se tornou independente. Depois da independência do Uruguai, declarada em 1830, essa região continuou a ser disputada, mas pela Confederação Argentina e o Império do Brasil, também já independentes, estando ora sob a influência de um desses países, ora sob a influência do outro.
Em 1836 a jovem República Oriental do Uruguai viu dois de seus governantes constitucionais se enfrentarem na batalha de Carpintería. Parte dos combatentes era liderada por seu primeiro presidente, Fructuoso Rivera, e usava braçadeiras vermelhas; a outra parte dos contendores era liderada por seu então presidente, Manuel Oribe (que havia sido ministro da guerra de Fructuoso Rivera), e usava braçadeiras brancas. Terminada a batalha com a vitória dos blancos, estabeleceram-se os partidos que, liderados respectivamente por Rivera e Oribe – seus fundadores -, bipolarizariam a política do país a partir de então: o Partido Colorado (liberal) e o Partido Blanco (conservador). Esse bipartidarismo só seria rompido depois da ditadura militar uruguaia, já no século XXI, com a eleição de Tabaré Vasquez, da coalisão denominada Frente Ampla, autorizada a existir legalmente com a redemocratização do país. Por isso Rivera e Oribe me parecem ter importância até os dias atuais na história política do Uruguai, visto que os partidos que fundaram ainda existem, com determinadas modificações.
Bom, e os gaúchos? O presidente Rivera (pró-Brasil), no poder novamente no Uruguai enquanto se desenrolava a Revolução Farroupilha, opta por auxiliar Bento Gonçalves, presidente da República Rio-Grandense e seu antigo inimigo político. Esse auxílio dura até 1843, Quando a chamada Guerra Grande, já em curso há quatro anos, é definitivamente transferida a Montevidéu, sitiando-se a cidade e acirrando-se de vez os enfrentamentos entre blancos e colorados, que só terminariam em 1851, com a vitória dos colorados e a ruína econômica completa do país.
O presidente Oribe (pró-Argentina)se rende às tropas brasileiras em 1851, com o fim da Guerra Grande – transformada em conflito internacional e só encerrada após muitas intervenções externas -, abandonando a vida política no ano seguinte, depois de tantos intensos combates com os colorados. Informações oficiosas me deram conta de que Manuel Oribe era bonitão e se parecia bastante com o nosso imperador Dom Pedro I, embora não tivesse o mesmo “olhar 43” do brasileiro. Hahahhaa Divertido...
Após visitar todos os outros presidentes uruguaios, deixamos o museu com a cabeça fervilhando de tanta história em um período tão curto de tempo. E quando estávamos na calçada fronteira ao Teatro Solis, o vento gelado de Montevidéu veio nos receber no auge de sua força. Lendo assim parece um exagero, mas a câmera fotográfica em punho, que mirava o teatro, teve de esperar. A força do vento exigia concentração e cuidado, para podermos permanecer nos mesmos lugares onde estávamos. A chuva caía ainda e o vento fustigava com ímpeto. Me preocupei, claro, mas ao mesmo tempo pensei que, presente de última hora, eu não deixaria Montevidéu sem conhecer a chuva e o vento tão afamados. Meu cabelo solto e comprido de brasileira desprevenida me espanava com força o rosto, voando descontrolado em todas as direções. Pensei: “Ah, depois eu enxugo, desembaraço, faço o que tiver de fazer; a cada momento o seu momento”.
Parabéns Yara por retratar tão bem a visita ao Museu e parte da história do Uruguai ao qual estamos diretamente envolvidos por conta da disputa de território . Você detalhou muito bem toda a visita . Quem ñ conhece o Museu pode , através de suas palavras e da foto , viajar na história e saber de uma parte da história deste povo . Visita super importante e válida .
ResponderExcluirNa verdade, haveria muito mais que escrever, mas o espaço era pouco e tenho que ir devagar com os internautas... hahahahahaha Uma boa crônica tem que ser, primeiro, curta, ou então deixa de ser crônica. rsrsrs Bjs
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